Pensei em colocar como título “Os juros que afagam são os mesmos que apedrejam”. Por quê? Um cenário de juros baixos tende a melhorar o ambiente de negócios, a incrementar o crédito e, por consequência, impulsionar o crescimento da economia e da oferta de empregos. Por outro lado afeta significativamente a rentabilidade sobre os investimentos, acarretando diversos impactos sobre a construção de um patrimônio com o objetivo de suportar a aposentadoria . Quais são esses efeitos? Quanto devo guardar do meu salário considerando-se diversos cenários para a taxa de juros para obter uma remuneração igual na aposentadoria?
A taxa básica da economia medida pela taxa Selic se encontra em 7,25% após o último corte patrocinado pelo Banco Central (BC). Um ano atrás a taxa estava em 12,5%. Essa redução é extremamente benéfica para a economia incentivando investimentos produtivos e o aumento da oferta de empregos. Os jovens terão maiores chances de obter um bom emprego do que a geração que entrou no mercado de trabalho nas décadas de 80 e 90.
Esse é o lado positivo da redução dos juros. Mas toda moeda tem duas faces. O lado perverso é que o patrimônio financeiro dos aplicadores tende a crescer mais lentamente. Isso produz impactos significativos na aposentadoria. O investidor tem três opções, alternativamente ou cumulativamente, para não ter problemas quando se retirar: aumentar a parcela do salário a ser poupado, postergar o início da aposentadoria ou recorrer a investimentos de maior risco com possibilidade de maior retorno. Nesse último caso, fundos multimercados, fundos de “private equity” e o mercado acionário aparecem como boas alternativas.
Os economistas Fábio Giambiagi e Felipe Vilhena Amaral fizeram uma interessante simulação no artigo “Fundos de pensão: a escolha de Sofia”, publicado no Valor em 10/10/12. Imagine que “um homem solteiro autônomo comece a trabalhar aos 20 anos, se aposente aos 55 anos e viva até os 80 anos de idade”. Qual o percentual do salário esse trabalhador teria que poupar para ter uma aposentadoria igual a última remuneração? Os juros trabalham a favor do trabalhador. Quanto maior a taxa de juros, menor será a parcela a ser poupada. Giambiagi utiliza na tabela abaixo duas variáveis: a taxa de juros reais e o crescimento anual real do salário ao longo da vida produtiva.
Se o trabalhador não tiver crescimento real dos proventos ao longo da vida produtiva e os juros reais forem de 6% a.a. no período, a parcela a ser poupada do salário seria de 11,5%. Esse cenário não é tão distante. Até 2008, os juros reais (taxa Selic menos a inflação medida pelo IPCA) eram superiores a 6% a.a. Em 2009, foi de 5,4%. Contudo hoje após as sucessivas quedas da meta Selic, os juros reais se encontram próximos a 2% a.a. Nesse caso, a parte a ser poupada do salário é bem maior de acordo com o estudo de Giambiagi e Vilhena – 39,1% - caso se mantenha constante o início da aposentadoria aos 55 anos.
Apesar de o exemplo ser simplista, pois não considera os profissionais que contribuem para o INSS, o exercício de Giambiagi desnuda o brutal impacto que a queda dos juros tem sobre a formação do patrimônio visando a aposentadoria. Essa simulação matemática tem mais força do que qualquer texto.
A fim de evitar esse acréscimo da renda poupada, o investidor individual terá que alocar seus recursos em aplicações com maior rentabilidade ou postergar o início da merecida aposentadoria. Mas nem tudo são lágrimas. As chances de ficar desempregado ao longo da vida produtiva são menores do que nas décadas anteriores.
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